Por Greice Rodrigues
Grande Secretaria da Saúde
Informativo Saúde
A chefe do Departamento de Medicina Legal da Flórida, nos EUA,
diz que a maioria das mortes pode ser evitada!
Há 20 anos, a médica americana Jan Garavaglia, 53 anos, decidiu
trocar o consultório pelo necrotério.
Ela estava cansada de lidar diariamente com pacientes queixosos
a sua frente.
Apesar de todas as suas recomendações, eles resistiam e não
mudavam de estilo de vida. Continuavam fumando, comendo mal,
não se exercitavam.
"Isso me deixava muito frustrada", diz a médica.
Curiosa por natureza, ela decidiu que seria mais fascinante descobrir por que
as pessoas morrem. Tornou-se legista, faz hoje mais de mil
autópsias por ano e finalmente descobriu o que tanto queria.
"Depois de anos trabalhando nessa área,
Descobri que morremos por causas idiotas", afirma.
"São coisas tolas, que podem ser prevenidas, como os pequenos lapsos de
atenção ocorridos enquanto dirigimos e falamos ao celular." Chefe do Departamento
de Medicina Legal da Flórida, nos Estados Unidos, Jan também é conhecida como
Dr. G,
nome que adota no programa “Medical examiner”, exibido
diariamente pelo canal Discovery Home &
Health.
A médica acaba de lançar o livro Como não morrer! (Ed. Prumo),
no qual relata casos reais de pessoas que perderam a vida por simples
descuidos. Da Flórida, ela falou à ISTO É.
ISTO É - Quais as lições que a sra. aprendeu nesses anos todos
atuando como legista?
Dra. Jan - Cada caso que investigo sempre me ensina algo. O
corpo conta a história de como alguém viveu,
morreu e de que forma a morte poderia ter sido evitada.
Durante meus 20 anos como legista, vi que muitas das mortes não
precisavam ter acontecido.
ISTOÉ – Por quê?
Dra. Jan - Por quê?
Porque foram resultado de causas idiotas. Claro que algumas
pessoas têm falta de sorte e desenvolvem uma doença ou sofrem um acidente que é
totalmente inevitável, mas muitos constroem a
sua má sorte.
Lembro do caso de um homem de meia-idade com sobrepeso que nunca
se preocupara em fazer um check-up. Um dia ele subiu os degraus de seu
apartamento com algumas compras na mão e,
quando entrou, sentou no sofá e morreu. A autópsia mostrou
alterações há muito existentes no seu coração e rins e uma hemorragia no
cérebro. Tudo causado por pressão alta, uma doença facilmente tratável que ele
julgava não sofrer.
Outro caso do qual me lembro bem foi o de uma senhora que
tropeçou no tapete de casa e quebrou o quadril. Ela morreu dias depois, em
decorrência de complicações causadas por essa queda. São dois exemplos
clássicos de mortes evitáveis.
O senhor, por exemplo, poderia ter ido ao médico ao menos uma
vez. Provavelmente teria descoberto a hipertensão. E a senhora
deveria ter tirado o tapete, recomendação bastante útil em residência de
pessoas mais velhas, mais propensas a quedas.
ISTO É - A sra. pode citar outros casos?
Dra. Jan - Lembro de ter feito uma autópsia em um senhor que foi
encontrado morto no quintal de casa. Vi como nossa dieta ocidental, pobre em
fibras, havia devastado o cólon (parte final do intestino grosso) daquele
homem, causando uma inflamação gravíssima que teve como resultado a sua morte.
Nossa
dificuldade em enriquecer a alimentação com frutas e verduras
nos leva a situações como essa, em que expomos o corpo a perigos
desnecessários.
ISTO É - Como não morrer prematuramente?
Dra. Jan - Consigo ver várias maneiras de evitar mortes
prematuras exatamente como os outros médicos vêem maneiras de prevenir doenças.
Como patologista, enxergo muitas coisas que a maioria das pessoas não vê. Nem
sempre são os traumas ou as situações dramáticas que matam as
pessoas, mas os pequenos lapsos de atenção ou aqueles julgamentos feitos
com um milésimo de segundo de atraso.
A vida é uma série de escolhas. Somadas à genética e à sorte,
elas determinam nosso destino. Você pode controlar o que come, a velocidade com
que dirige, pode escolher se vai ou não abusar das drogas ou da bebida. Digo sempre
que não sou perita em entender os motivos que levam alguém a usar drogas ou
posso não saber
como tratar vícios. Mas sei como o álcool e as drogas podem
levar alguém à morte.
ISTO É - Fazemos escolhas
erradas e por isso morremos?
Dra. Jan - Se você escolhe
abusar do álcool, usar drogas e dirigir em alta velocidade, precisa estar
consciente de que esses
comportamentos podem matá-lo. Do mesmo modo que não cuidar do peso, não fazer atividade física ou alimentar-se mal. São escolhas que você faz
conscientemente. Portanto, deveria saber
as consequências básicas dessas decisões e no que elas podem
resultar. Tomar as decisões corretas pode lhe dar a oportunidade de viver por
mais tempo. Não acredito que a diferença entre a vida e a morte seja apenas uma
questão de tempo.
ISTO É - O que as pessoas podem fazer?
Dra. Jan - É impossível escapar da morte. Mas você pode impedir
que ela chegue prematuramente com atitudes simples. Muita gente não sabe, mas
deixar a janela do carro aberta quando se está em movimento aumenta o risco de
danos mais graves em um acidente.A pessoa pode ser arremessada para fora do
carro
com mais facilidade. Outros exemplos de boas atitudes são
prender corretamente o cinto de segurança ou acelerar menos.
Evitar o álcool é outra medida.
Pelo menos 40% das pessoas que morrem no trânsito apresentam
álcool no organismo. A distração no trânsito também mata. Para algumas pessoas,
o carro é o lugar perfeito para retocar a maquiagem ou falar ao telefone. A falta
de atenção no trânsito é responsável por cerca 25% de todos os acidentes nos
Estados
Unidos. Outros conselhos são fazer mudanças sutis na dieta ou
seguir as ordens do seu médico.
Também precisamos aprender a ouvir o corpo, não ignorar os
sinais que ele dá quando alguma coisa está errada.
ISTO É - Isso significa fazer um check- up periodicamente?
Dra. Jan - Compreendo que algumas pessoas não querem ou não
podem pagar uma consulta médica. Mas sou da turma que defende o check-up anual.
Mesmo que seja apenas para construir uma boa relação com o seu médico e
conversar com ele sobre os cuidados com a saúde. Mas é uma oportunidade para
verificar o
colesterol, a pressão arterial e o açúcar no sangue. Esses
assassinos silenciosos podem matar sem que você nunca tenha se sentido mal. Os
primeiros sintomas podem ser fatais. Você terá vida longa se mantiver esses
índices em níveis normais.
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ISTO É - Que outras
atitudes podemos adotar?
Dra. Jan - O que você
precisa saber sobre o remédio que o seu médico prescreveu? Muita coisa. Nenhum medicamento é 100% seguro para todo mundo. Mesmo aqueles
vendidos sem prescrição médica podem
causar
efeitos adversos, especialmente se forem tomados de maneira incorreta.
Por exemplo: um único comprimido de aspirina pode resultar em um
ataque de asma que ameace a vida de uma pessoa sensível a essa droga.
ISTO É - Em geral ocorrem mais mortes por acidentes ou por negligência
em relação à saúde?
Dra. Jan - Nos Estados Unidos, 40% das mortes ocorrem por doença
prematura, ou seja, são previsíveis.
Outros40% são por acidentes, 10% são por suicídios e outros 10% por
homicídios.
ISTO É - Quem morre mais antes da hora: os homens ou as
mulheres?
Dra. Jan - Os homens. Eles costumam ignorar a saúde e abusar do
álcool e das drogas. Além disso, os homens vão muito menos ao médico que as
mulheres. Eles reprimem a dor, ignoram os sintomas e negam a doença. Também
fazem escolhas estúpidas. Eles dirigem de modo agressivo ou sob influência de entorpecentes
e por isso pagam com a própria vida.
Nos Estados Unidos, os acidentes, principalmente os automobílisticos,
matam 35 mil homens a cada ano.
O dobro da quantidade de mulheres. Assombrosamente essas mortes
ocorrem até os 44 anos.
ISTO É - Por que a sra. optou por trabalhar como legista?
Dra. Jan - Meu professor de química na escola secundária me inspirou
a me tornar médica. Mas fiquei desiludida durante a residência e percebi que a
medicina não combinava com a minha personalidade.
Gostava de compreender o funcionamento do corpo humano e de chegar
ao diagnóstico. Mas lidar diretamente com reclamações de pacientes - muitas
delas relacionadas com a maneira como eles estavam vivendo–me desgastou.
ISTOÉ - Mas essa
realidade não faz parte da rotina do médico?
Dra. Jan - Trabalhava em uma
clínica na qual tratava pessoas que tinham principalmente doenças relacionadas ao estilo de vida, ao hábito de fumar, de não fazer
exercícios, ao fato de estarem acima do peso. Ficava frustrada porque, apesar das minhas recomendações,
poucos mudavam suas rotinas.
Resolvi que seria mais fascinante descobrir por que as pessoas
morrem.
ISTO É - Como é lidar tão de perto com a morte?
Dra. Jan - O mundo da morte não é exatamente o que os meus pais
imaginaram para mim. Mas amo juntar peças, usar o pensamento criativo e
resolver mistérios. A morte nunca me preocupou, na verdade. Eu a vejo como uma
parte natural da vida. Eduquei-me dentro dos preceitos da religião católica com
um
conjunto de valores morais bastante claros. Embora tenham me
ensinado que há um céu e um inferno, nunca pensei muito sobre o que acontece
conosco depois que morremos. Mas não acredito que passamos por este mundo
apenas para terminarmos deitados numa laje. A morte tem muito a nos ensinar.
ISTO É - Por isso resolveu escrever o livro?
Dra. Jan - Ao longo desses anos vivenciei muitas experiências
que, tenho certeza, poderão ajudar as pessoas a
compreender a sua saúde e a encarar de um novo jeito as
consequências das decisões cotidianas que tomam. Assim, poderão cuidar melhor
delas mesmas e daqueles que as cercam. Felizmente, percebo que essas ações têm
impacto. No meu programa de tevê, o “Medical examiner”, recebo muitas cartas e
comentários de espectadores afirmando que finalmente conseguiram
relacionar de maneira concreta como seus comportamentos afetavam sua saúde.
ISTO É – E a sra.? Mudou algo na sua vida a partir de sua
experiência?
Dra. Jan - Estar rodeada pela morte me ensinou a viver uma vida
mais saudável e feliz. Minha profissão também me ensinou muito sobre as pessoas
e a condição humana. Mas a mais fundamental das lições foi sobre como a vida é
preciosa.
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